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17:45 | 27/06/2019
Era uma vez um alfaiate que era grande fanfarrão, embora muito mau pagador. Certo dia, deu- lhe na telha sair pelo mundo afora. Logo que lhe foi possível, abandonou a oficina, cantarolando alegremente.

Pelo caminho foi andando,
pelas pontes foi passando,
tivesse ou não tivesse gente,
para aqui para acolá,
mas sempre para a frente.

Quando saiu do recinto da cidade, avistou ao longe uma montanha pontiaguda e, no seu cume, uma torre tão alta que parecia furar o céu, a qual sobressaia do meio de uma grande floresta virgem.
Cáspite! – exclamou o alfaiate, – o que será aquilo?
E, espicaçado pela curiosidade, foi correndo naquela direção. Mas ao chegar lá, abriu, imensamente, os olhos e a boca. A torre tinha pernas! E ela transpôs de um salto a montanha abrupta e estacou como enorme gigante diante do alfaiate.
– Que vens procurar aqui, mosquitinho? – bradou com uma voz tão estentórea como o retumbar de um trovão. O alfaiate balbuciou trêmulo:
– Estou vendo se me é possível ganhar um bocado de pão aí nessa floresta.
– Se esse é o teu intento, podes vir desde já trabalhar para mim, – disse o gigante.
– Por quê não? Se for necessário irei! Mas qual será meu salário?
– Teu salário? – respondeu o gigante, – já o verás! Trezentos e sessenta e cinco dias por ano e mais um dia se o ano for bissexto; serve-te?
– Que seja! – respondeu o alfaiate, e pensava consigo mesmo: “Deve-se esticar as pernas conforme o comprimento da coberta. Mas procurarei ver-me livre quanto antes.”
Então, o gigante disse-lhe:
– Vai, velhaquete, e traze-me uma bilha de água.
– E por quê não o regato e mais a fonte toda? – perguntou o fanfarrão, e, pegando na bilha, foi buscar água.
– O quê? O regato e a fonte toda? – resmungou o gigante por entre as barbas e, como era um tanto estúpido e tolo, ficou alarmado: “aquele malandro é muito sabido, sabe algo mais do que assar maçãs; provavelmente tom mandrágora no corpo. Cuidado, meu velho, esse não é criado para ti!”
Quando o alfaiate lhe trouxe a água, o gigante mandou-o cortar algumas achas de lenha, a fim de levá-las para casa.
– Por quê não a floresta inteira de uma vez?

A floresta toda inteira,
com as árvores velhas e novas
e tudo o que ela contém.
Liso e nodoso também?

perguntou o alfaiate, e foi rachar a lenha.
– O quê?

A floresta toda inteira,
com as árvores velhas e novas
e tudo o que ela contém.
Liso e nodoso também?

– E mais o regato com a fonte? – resmungou por entre as barbas o crédulo gigante; e seu medo aumentou ainda mais: – “aquele velhaco sabe demais, tem com toda a certeza mandrágora no corpo! Cuidado, meu velho, esse não é bom criado para ti.”
Quando o alfaiate lhe trouxe a lenha, o gigante mandou-o caçar dois ou três porcos-do-mato para o jantar.
– Por quê não mil de uma vez e os demais também, com um só tiro? – perguntou o alfaiate farofeiro.
– O quê? – exclamou assustadíssimo o gigante, tremendo de medo como um coelho: – por hoje basta; agora vai dormir.
O gigante, de tão amedrontado, não conseguiu pregar olho durante a noite toda, e ficou a pensar na maneira de livrar-se daquele maldito criado embruxado.
A noite é boa conselheira. Na manhã seguinte, o gigante e o alfaiate sairam e foram ter a um brejo todo cercado de salgueiros. Aí o gigante disse:
– Escuta aqui, alfaiate, senta-te num galho desse salgueiro; eu gostaria de ver se és capaz de vergá-lo com o teu peso!
De um pulo o alfaiate encarapitou-se no galho; prendeu a respiração para ficar mais pesado, tão pesado que o galho dobrou-se até quase tocar o chão. Mas, infelizmente, teve de respirar de novo e, não tendo consigo o ferro de engomar, que sempre trazia no bolso, o galho ao voltar à sua posição normal, projetou-o a tal altura que nunca mais alguém o viu.
Se ainda não caiu no chão, deve estar certamente planando pelo espaço até agora.

 



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