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O casamento de Dona Raposa

06:00 | 28/06/2019
PRIMEIRO CONTO

Houve, uma vez, um velho Raposo que tinha nove caudas; suspeitando que sua mulher lhe era infiel, quis deixá-la cair em tentação.
Deitou-se debaixo do banco, sem mexer nem um músculo, e fingiu-se morto.
Dona Raposa foi para o quarto e fechou-se dentro; enquanto isso, sua criada, a Donzela Gata, cozinhava qualquer coisa, sentada no fogão. Assim que se espalhou a notícia de que o Senhor Raposo havia falecido, apresentaram-se logo os pretendentes. A criada ouviu chegar alguém e bater à porta; foi abrir. Era um jovem Raposo, que disse:

Que fazes. Donzela Gala,
Dormes ou estás acordada?

Ela respondeu:

Não durmo, não; estou acordada.
Quer saber em que estou ocupada?
Esquento a cerveja, ponho manteiga, e viva!
Está pronto o banquete. Quer ser meu conviva?

– Agradeço-lhe, Donzela! – disse o jovem Raposo. – Que está fazendo Dona Raposa?
A criada respondeu:

Ela em seu quarto está,
E não para de chorar.
Seus olhinhos vermelhos estão,
Porque morreu o velho Raposão!

– Diga-lhe, Donzela, que aqui está um jovem Raposo e deseja casar com ela.
– Muito bem, jovem senhor.

Foi a gata, tripe-trape.
Bateu à porta, tique-taque:
Dona Raposa, a senhora está aí?
– Sim, galinha, estou aqui!
Lá fora está um pretendente.
– Tem cara que se apresente?

– Tem nove lindas caudas, tal como o Senhor Raposão, a boa alma?
– Ah! não! – respondeu a Gata – tem uma só.
– Então, não o quero, não.
Donzela Gata desceu e despediu o pretendente. Daí a pouco bateram novamente à porta e apresentou-se outro Raposo, que desejava casar com Dona Raposa; este tinha duas caudas, mas, apesar disso, não teve melhor sorte que o primeiro. Depois vieram outros, sempre com uma cauda a mais e todos foram repelidos. Até que, por fim, apareceu um que tinha nove caudas, como o velho Raposão. Quando o soube, a viúva disse alegremente à Gata:

Abram a porta e o portão,
E varram fora o velho Raposão.

Mas, na hora em que devia realizar-se o casamento, moveu-se o velho Raposão em baixo do banco; então surrou, gostosamente, toda aquela corja e, juntamente com Dona Raposa, expulsou a todos de casa para fora.

SEGUNDO CONTO

Tendo morrido o velho Raposão, apresentou-se o Lobo como pretendente. Bateu à porta; a Gata, que servia em casa de Dona Raposa, foi abrir. O Lobo cumprimentou-a dizendo:

Bom dia. Senhora Gala de Voltalá,
Por quê ainda sozinha está?
E o que faz de bom por cá?

A Gata respondeu:

Uma sopa da pão e leite;
Está pronto o banquete; talvez aceite?

– Muito obrigado, Dona Gata, – respondeu o Lobo. – Dona Raposa está em casa?
A Gata disse:

Recolhida está em seu quarto,
Com o rosto banhado em pranto.
Chora, e com razão,
A morte do Senhor Raposão!

O Lobo respondeu:

Quer ela outro marido ter?
É só dar-se ao trabalho de descer!
Correndo subiu a Gata,
Na escada machucou a pata.
Bateu na porta com os cinco anéis
Que tinha na mão:
Se Dona Raposa quiser,
Um outro marido ter.
Só tem que a escada descer!

Dona Raposa perguntou:
– Tem ele calçõezinhos vermelhos e focinho pontudo?
– Não – respondeu a Gata.
– Então, não me serve.
Repelido o Lobo, apresentaram-se um cão, um veado, um coelho, um urso, um leão e, um após outro, todos os demais bichos da floresta.
Mas sempre faltava uma das belas qualidades que possuirá o Senhor Raposão; e sempre a Gata teve de despedir os pretendentes.
Finalmente, chegou um jovem Raposo. Então, disse Dona Raposa:
– Tem esse senhor calçõezinhos vermelhos e um focinho pontudo?
– Tem sim – disse a Gata.
– Então mande-o subir! – disse Dona Raposa; e ordenou a criada que preparasse a festa para o casamento:

Gata, varre depressa a sala.
Joga o velho Raposão na vala,
Ele trazia muitos ralos gordos,
Mas, guloso, comia-os todos.
Nada me dando, o maldoso.

Aí celebrou-se o casamento com o jovem Raposo; e cantaram e dançaram, e, se não cansaram, dançando ainda estão.

 

 



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