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16:03 | 27/06/2019

Houve, uma vez, um moleiro que tinha uma filha, muito bonita; quando ela atingiu a idade de casar, o pai decidiu arranjar-lhe um bom casamento, e pensava: “Se aparecer um pretendente em condição e a pedir em casamento, dou-lha.”
Não demorou muito, apareceu um pretendente, que demonstrava ser muito rico, e o moleiro, não achando inconveniente algum, prometeu dar-lhe a filha.
A moça, porém, não o amava como deve ser amado um noivo, e não tinha nem um pouco de confiança nele. Cada vez que o via ou que pensava nele, sentia-se dominada por inexplicável repulsa. Um dia, disse o noivo:
– És minha noiva e nunca me visitas!
Não sei onde é a vossa casa, – respondeu a moça.
– A minha casa, – disse ele, – fica bem no âmago da floresta.
Ela pretextou que não conseguiria encontrar o caminho para ir lá, mas ele insistiu:
Eu já convidei as outras visitas, para que possas te orientar, espalharei cinza no caminho da floresta.
No domingo, quando a moça estava pronta para sair, sentiu grande medo, sem saber por que e, para marcar bem o caminho, encheu os bolsos com lentilhas e ervilhas. Logo na entrada da floresta, viu a cinza espalhada; foi seguindo por ela, mas a cada passo ia deixando cair, de cada lado do caminho, um grão de ervilha e de lentilha.
Andou quase o dia inteiro, até que, por fim, chegou ao âmago da floresta; aí estava uma casa solitária, que nada lhe agradou, pois lhe parecia tenebrosa e inquietante.
Entrou; não havia ninguém lá dentro e reinava o mais profundo silêncio. De repente, uma voz gritou:

Foge, foge. bela noivinha,
de salteadores é esta casinha.

A moça ergueu os olhos e viu que a voz partia de um pássaro preso numa gaiola dependurada na parede. Ele gritou novamente:

Foge, foge. bela noivinha,
de salteadores é esta casinha.

A noiva, então foi de um quarto para outro, percorrendo toda a casa, sem encontrar alma viva. Finalmente, chegou à adega. Viu lá sentada uma velha decrépita, cuja cabeça tremia.
– Podeis dizer-me se mora aqui meu noivo? – perguntou a moça.
– Ah, pobre menina! – respondeu a velha, – onde vieste cair! Num covil de salteadores. Tu te julgas uma noiva em vésperas de casamento, mas tuas núpcias serão com a morte. Vê? Preparei no fogo um grande caldeirão com água; se cais nas mãos deles, serás picada impiedosamente em pedaços, depois cozida e devorada, pois eles são canibais. Se eu não me apiedar de ti, estarás perdida.
A velha, então, ocultou-a atrás de um tonel, onde não seria vista.
– Fica aí quietinha, como um ratinho, não te mexas e não dês sinal de vida; se não estás perdida! Esta noite, quando os salteadores estiverem dormindo, fugiremos as duas; há tanto tempo que venho aguardando a oportunidade!
Mal acabara de falar, chegou o bando de salteadores; vinham arrastando junto uma outra jovem; bêbados como estavam, não se impressionavam com seus gritos e lamentos.
Obrigaram-na a beber três copos cheios de vinho, um branco, um vermelho e um amarelo; com isso, partiu-se-lhe o coração. Arrancaram-lhe as belas roupas, deitaram-na sobre a mesa, cortaram em pedaços seu lindo corpo e o salgaram.
A pobre noiva, atrás do tonel, tremia como vara verde; via com os próprios olhos o destino que lhe reservavam os bandidos.
Um deles, vendo brilhar um anel no dedinho da morta, tentou arrancá-lo; não o conseguindo tão facilmente, pegou no machado e decepou o dedo que, dando um pulo no ar, foi cair atrás do tonel, bem no colo da noiva. O bandido pegou num candeiro e pôs-se a procurá-lo, mas inutilmente. Então um outro disse-lhe:
– Já procuraste atrás do tonel?
Mas a velha gritou:
– Venham comer, vós o procurareis amanhã; o dedo não foge, não!
– A velha tem razão, – disseram eles.
Deixaram de procurar e foram sentar-se à mesa para
comer; então a velha pingou um sonífero dentro do vinho; tendo bebido, todos adormeceram e começaram a roncar fortemente.
Ouvindo-os roncar, a noiva saiu do esconderijo e teve que pular por sobre os corpos estendidos no chão, com um medo horrível de acordar algum. Mas, com o auxílio de Deus, conseguiu passar. A velha saiu com ela, abriu a porta e ambas fugiram o mais depressa possível do covil dos assassinos. O vento levara a cinza, mas os grãos de ervilha e de lentilha haviam brotado e, como o luar estava bem claro, elas seguiram o caminho indicado.
Andaram a noite toda e só chegaram ao moinho pela manhã. A jovem contou ao pai tudo o que acontecera, sem omitir nada.
Quando chegou o dia do casamento, o noivo apresentou-se. O moleiro, porém, convidara todos os parentes e amigos. Na mesa, durante o banquete, cada conviva teve de contar uma história. A noiva, sentada ao lado do noivo, nada dizia. Então, o noivo voltou-se para ela.
– E tu, meu coração, nada tens a contar? Narra uma história qualquer!
– Bem, contarei um sonho que tive, – disse ela.
“Ia andando sozinha por uma floresta e fui parar
numa casa, solitária. Dentro não havia ninguém, apenas um pássaro preso numa gaiola dependurada na parede, o qual, vendo-me, gritou:

Foge, foge, bela noivinha,
de salteadores é esta casinha.

Gritou isso duas vezes. – Meu amor, é apenas um sonho! – Percorri os quartos e todos estavam vazios e fúnebres! Finalmente, fui ter à adega e lá estava uma velha decrépita sentada, a cabeça a lhe tremer; perguntei-lhe:
“Mora aqui o meu noivo?”
“Ah! pobre menina, – respondeu-me ela, – caiste num covil de assassinos! Teu noivo mora aqui, mas tu serás assassinada, cortada em pedaços, cozida e devorada. – Meu amor, é apenas um sonho! – A velha ocultou-me atrás de um tonel; mal me escondera, chegaram os bandidos, arrastando consigo uma moça; deram-lhe a beber três copos de vinho, um branco, um vermelho e um amarelo, e, com isso, partiu-se-lhe o coração. – Meu amor, é apenas um sonho! – Depois arrancaram-lhe as belas roupas, deitaram-na sobre a mesa, cortaram em pedaços seu lindo corpo e o salgaram. – Meu amor, é apenas um sonho! – Um dos bandidos viu um anel no dedinho dela e, achando difícil arrancá-lo, decepou o dedo com o machado; mas o dedo, dando um pulo no ar, foi cair atrás do tonel, justamente no meu colo. Ei-lo aqui.
Assim dizendo, tirou do bolso o dedinho e mostrou- o a todos os presentes.
O bandido, que durante a narrativa ficara branco como um pano lavado, pulou da cadeira e tentou fugir; mas os convidados agarraram-no e o entregaram à justiça.
Ele e todo o bando foram condenados e justiçados, pagando assim seus terríveis crimes.

 



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